Complemento da Ação: Cuida-se do Projeto de Lei Ordinária nº 037/2025, de autoria do Poder Executivo Municipal, que “MODIFICA O ARTIGO 110 DA LEI MUNICIPAL N°. 1716, DE 23 DE DEZEMBRO DE 2002, QUE DÁ TRATAMENTO AO ISSQN, PROCESSO FISCAL E DÍVIDA ATIVA”. Consta nos autos ofício de encaminhamento da proposição com pedido de Urgência, Mensagem ao Projeto de Lei nº 013/2025 e corpo do projeto de lei.
Observados os trâmites regimentais, o projeto foi submetido à publicidade e à deliberação na 15ª Sessão Ordinária do presente exercício legislativo, sendo aprovada a urgência simples e, em sequência, encaminhado a esta Procuradoria para manifestação jurídica.
Nos termos do art. 30, inciso I, da Constituição da República Federativa do Brasil (CRFB), combinado com o art. 8º, inciso I, da Lei Orgânica do Município de Itapemirim (LOM), compete ao Município legislar sobre assuntos de interesse local. Desta forma, a matéria não conflita com a competência privativa da União Federal (art. 22 da CRFB), bem como não conflita com a competência concorrente entre os Entes Federativos (art. 24 da CRFB).
A Lei Orgânica estabelece a competência do Município de Itapemirim para legislar sobre assunto de interesse local (art. 8º, inciso da LOM c/c art. 30, inciso I da CRFB). A iniciativa legislativa no âmbito municipal é regida, entre outros dispositivos, pelo art. 124 da Lei Orgânica do Município de Itapemirim, que expressamente prevê que a apresentação de projetos de lei cabe a qualquer vereador, às comissões permanentes, ao prefeito e aos cidadãos, ressalvadas as hipóteses de iniciativa exclusiva do Chefe do Poder Executivo, conforme determinação legal específica. O art. 36, inciso II, da Lei Orgânica Municipal estabelece ser de iniciativa privativa do Chefe do Poder Executivo a proposição de matérias como a tratada no presente Projeto de Lei, de modo que, considerando a autoria da proposição, verifica-se sua adequação legal.
Quanto ao mérito da proposição, verifica-se que o projeto de lei visa alterar a redação do caput do art. 110 e do §2º da Lei Municipal nº 1.716, de 23 de dezembro de 2002, com o objetivo de realizar duas principais alterações: i) ampliar de 03 (três) para 05 (cinco) membro da Junta de Impugnação Fiscal (JIF) e; ii) a discricionariedade do Chefe do Poder Executivo designar o Presidente da JIF dentre os nomeados. Não obstante, o art. 2º do projeto de lei concede efeito retroativo aos efeitos da lei para 01 de maio de 2025.
Sobre o tema, aplica-se a Lei Municipal nº 2.899, de 03 de novembro de 2025, que instituiu a gratificação especial para os membros da JIF, possuindo o seu respectivo valor alterado conforme Decreto nº 21.242, de 13 de janeiro de 2025. Nesse sentido, foi realizado Estimativa do Impacto Orçamentário-Financeiro e Declaração de Adequação Orçamentária-Financeira em anexo aos autos.
Contudo, cumpre registrar eventual incongruência nos valores apresentados na estimativa de impacto. Conforme consta do documento técnico, a previsão é de um acréscimo de R$ 105.000,00 (cento e cinco mil reais e oitenta centavos) “para o exercício de 2025 a partir da data deste impacto”, datado de maio do mesmo ano. Ocorre que a majoração do número de membros da JIF se dá de 03 (três) para 05 (cinco), além do presidente, totalizando 06 (seis) beneficiários. Mesmo considerando o valor de R$ 1.500,00 por membro, conforme o Decreto nº 21.242/2025, os cálculos não correspondem ao número de meses restantes no exercício (maio a dezembro), nem tampouco fecham se projetados para 12 meses.
Essa disparidade demanda análise do setor técnico responsável pela estimativa, a fim de verificar se houve equívoco na base de cálculo utilizada ou se há elementos adicionais que justifiquem o montante indicado. A precisão e adequação do impacto orçamentário são requisitos essenciais à conformidade da proposição legislativa conforme o art. 16 da Lei de Responsabilidade Fiscal, bem como ao art. 113 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias.
Nos termos do art. 16 da Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar nº 101/00), toda criação, expansão ou aperfeiçoamento de ação governamental que implique aumento de despesa deve ser acompanhada da respectiva estimativa de impacto orçamentário financeiro, assegurando sua compatibilidade com o orçamento anual, plano plurianual e lei de diretrizes orçamentárias.
Neste sentido, também há análoga exigência contida no art. 113 do ADCT em nossa Carta Magna, sedimentado por precedentes de nossa Corte Superior, ratificando que: “A ausência de prévia instrução da proposta legislativa com a estimativa do impacto financeiro e orçamentário, nos termos do art. 113 do ADCT, aplicável a todos os entes federativos, implica inconstitucionalidade formal” (STF ADI 6074, Relator(a): ROSA WEBER, Tribunal Pleno, julgado em 21/12/2020, PROCES-SO ELETRÔNICO DJe-042 DIVULG 05-03-2021 PUBLIC 08-03-2021).
“Art. 113. A proposição legislativa que crie ou altere despesa obrigatória ou renúncia de receita deverá ser acompanhada da estimativa do seu impacto orçamentário e financeiro”.
No tocante à disposição prevista no art. 2º do projeto de lei, observa-se a expressão “retroagindo-se seus efeitos a 1º de maio de 2025”, devendo para tanto ser observado os reflexos jurídicos decorrentes dessa previsão legal. Tal disposição, ao prever efeitos retroativos, enseja relevantes reflexos jurídicos que tornam inviável e desaconselhável sua manutenção no texto legal, em razão da insegurança normativa e dos impactos práticos que poderão comprometer a legalidade e a execução da norma.
Em primeiro lugar, a aplicação retroativa da lei à data de 1º de maio de 2025 suscita questionamentos relevantes quanto à nomeação dos membros da Junta de Impugnação Fiscal (JIF), bem como à validade de eventuais atos administrativos. Caso a norma venha a ser publicada após essa data, não se mostra juridicamente viável considerar que os servidores nomeados futuramente possam ser designados com efeitos ex tunc, isto é, com data anterior à sua efetiva nomeação e exercício.
Além disso, o eventual pagamento da gratificação especial de R$ 1.500,00 a partir de 1º de maio de 2025, sem que os membros tenham efetivamente desempenhado suas funções nesse período, poderia caracterizar pagamento indevido e afronta aos princípios da legalidade e da moralidade administrativa, nos termos do art. 37, caput, da Constituição Federal.
Ainda, levanta-se a indagação sobre a possibilidade de tais membros se manifestarem validamente em processos administrativos fiscais anteriores à data de sua designação formal, o que seria incompatível com a lógica procedimental e com os princípios do devido processo legal e da competência funcional.
Nesse contexto, recomenda-se a supressão do trecho "retroagindo-se seus efeitos a 1º de maio de 2025" do art. 2º do Projeto de Lei, de modo a evitar as controvérsias jurídicas supramencionadas e assegurar o pleno alinhamento da norma aos princípios constitucionais e administrativos. Do ponto de vista técnico-legislativo, tal alteração deve se dar por meio de emenda modificativa, conforme previsão expressa no art. 126, § 5º, do Regimento Interno da Câmara Municipal. Assim, sugere-se a seguinte emenda modificativa ao art. 2º do Projeto de Lei:
Redação proposta:
“Art. 2°. Esta Lei entrará em vigor na data de sua publicação, revogando-se as disposições em contrário.”
A referida modificação assegura a integridade técnica e jurídica da norma, respeita os princípios orçamentários e evita qualquer possibilidade de responsabilização do gestor público pela adoção de medidas incompatíveis com a legislação vigente. Todavia, cumpre salientar que a modificação em decorrência a supressão do efeito retroativo a 1º de maio, impactará o valor destinado para o exercício de 2025, passando a ser de junho a dezembro.
A formulação legislativa deve observar rigorosamente os preceitos da Lei Complementar Federal nº 95, de 26 de fevereiro de 1998, que dispõe sobre a elaboração, redação, alteração e consolidação das leis.
Quanto ao quórum necessário para aprovação da matéria, em vista ao que aduz o art. 200 do Regimento Interno, por inexistir previsão expressa em sentido contrário, será adotado no caso em comento a maioria simples como número mínimo de votos para apreciação e aprovação da matéria. Deve-se atentar a imprescindibilidade de análise pela Comissão de Legislação, Justiça e Redação Final (art. 79 do RI) e conforme disposto no artigo 80 RI, a manifestação das Comissões de Finanças e Orçamento, seguido de deliberação em turno único, em conformidade com o regime de urgência simples aprovado e as normas regimentais desta Casa Legislativa (arts. 152 e 184, inciso II do RI).
Diante do exposto, conclui-se que o Projeto de Lei Ordinária nº 031/2025 apresenta regularidade formal quanto à iniciativa e à matéria tratada, nos termos da legislação vigente. Todavia, é imprescindível: (i) a revisão técnica da estimativa de impacto orçamentário-financeiro apresentada, objetivando verificar se houve equívoco na base de cálculo utilizada ou se há elementos adicionais que justifiquem o montante indicado, a fim de assegurar conformidade com os artigos 16 da LRF e 113 do ADCT; e (ii) a supressão da disposição contida no artigo 2º da proposição, que prevê efeitos retroativos à data de 1º de maio de 2025, por ensejar insegurança jurídica, potenciais atos inválidos e eventuais pagamentos indevidos, em afronta aos princípios da legalidade e moralidade administrativa.
No que tange a verificação da existência de interesse público, a Procuradoria Jurídica não irá se pronunciar, pois caberá tão somente aos vereadores no uso da função legislativa, verificar a viabilidade ou não desta preposição, respeitando-se para tanto as formalidades legais e regimentais.
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